Doença Diverticular

Definição

Doença observada em pacientes que possuem divertículos no tubo gastrintestinal.

O termo divertículo advém do latim diverticulum, que significa alojamento anexo. Divertículos são formações saculares que se formam em órgãos tubulares, abaulando uma de suas paredes, formando-se como estruturas anexas destes órgãos. Quando são formados por todas as camadas da parede do órgão originário, são chamados de divertículos verdadeiros. Quando são formados apenas por projeção da mucosa do órgão que lhes dá origem, através de orifícios de fraqueza existentes em sua camada muscular, são chamados de divertículos falsos.

No tubo gastrintestinal, o colo é o local onde mais comumente formam-se divertículos.

Muito embora existam divertículos verdadeiros no colo, o termo Doença Diverticular refere-se a afecção causada pela presença, no órgão, de divertículos falsos.

Doença diverticular é o termo atualmente usado em substituição a diverticulose, por ser mais amplo na abrangência das diversas formas de manifestação clínica da moléstia.

Incidência

A doença diverticular do colo é incomum em indivíduos com menos de 45 anos de idade e sua incidência aumenta exponencialmente nas faixas etárias mais elevadas.  Alguns pacientes citam história familiar de doença diverticular. Há uma leve preponderância da afecção entre as mulheres.

A afecção distribui-se geograficamente com predominância no Ocidente e nos povos com estilo de vida ocidental, ou que passaram a adotá-lo. Sendo assim, não era muito observada entre japoneses habitantes do Havaí, mas ultimamente tem-se notado um aumento da incidência da moléstia entre os mesmos, provavelmente reflexo da mudança de seu hábito alimentar, que migrou de uma dieta baseada em peixes e rica em fibras, para uma dieta tipicamente ocidental, rica em carboidratos refinados e pobre em fibras. O mesmo tem sido relatado na África do Sul. Por outro lado, no próprio continente africano, há povos onde virtualmente a doença é desconhecida e em que a dieta é ricamente baseada em fibras.

Quando estudado o tempo de trânsito cólico de estudantes de primeiro grau ingleses em comparação com habitantes ugandenses de mesma faixa etária observou-se que os ugandenses apresentavam um trânsito intestinal duas vezes mais acelerado, fruto da dieta rica em fibras que obedecem. Acredita-se que as fezes volumosas e hidratadas apresentadas por indivíduos sob uma dieta rica em fibras evitem a segmentação excessiva do colo e previnam a doença diverticular.

Há relatos na literatura de estar havendo, em alguns centros, uma diminuição do número de internações de casos de doença diverticular complicada em relação a anos anteriores, indicando, muito provavelmente, que esta mudança de padrão de comportamento da moléstia se deva ao fato da população ocidental estar mais consciente da importância da fibra não processada como alimento e estar ingerindo a mesma em quantidades terapêuticas.

No mundo inteiro, a doença diverticular incide mais freqüentemente no colo esquerdo, principalmente no sigmóide. No Japão, na Coréia, na China e na Malásia, no entanto, a doença diverticular incide duas vezes mais no lado direito do colo do que no esquerdo. Curiosamente, vem-se observando no Japão um aumento de casos de doença diverticular em ambos os lados do colo, provavelmente reflexo da adoção do estilo de vida ocidental naquele país.

Patologia

No intestino grosso, a doença diverticular costuma preservar o reto mas pode afetar qualquer segmento do colo. De acordo com a lei de LaPlace, que preceitua que a tensão na parede de um cilindro é diretamente proporcional à pressão no interior do cilindro multiplicada pelo raio e inversamente proporcional à espessura da parede, o sigmóide é o segmento cólico mais afetado pela doença por ser o de maior espessura muscular e o de menor diâmetro, mas o acometimento dele juntamente com o colo descendente também é muito freqüente. Ambas as regiões do colo são responsáveis por cerca de 87% dos casos de doença diverticular observada nos povos do ocidente. Muito embora a doença possa acometer o colo por inteiro, o espessamento muscular só costuma ser observado no sigmóide (Figura 1).

Os divertículos formam-se preferencialmente nas regiões situadas entre as tênias antimesentéricas e a mesentérica, ao lado dos orifícios de penetração muscular dos vasos cólicos. Quando ocorre formação diverticular na área antimesentérica intertenial, em geral a doença encontra-se em estado avançado (Figura 2). Clique no link a seguir e você será remetido ao site Gastrointestinal Pathology Index e observará divertículos azuláceos num colo sigmóide de aspecto empalidecido com apêndices epiplóicos hipertróficos. Para voltar ao texto, apague a janela que se abrir, clicando no botão com um X em seu canto superior direito. link 1

Os divertículos cólicos laterais são formados grosseiramente por duas camadas, a mucosa, internamente, e a serosa externamente. Na realidade, são a mucosa, a muscular da mucosa e a submucosa que se projetam em falhas existentes na musculatura circular. Pode-se observar, algumas vezes, uma camada muscular atenuada no colo diverticular. Os divertículos cólicos da região antimesentérica intertenial possuem, além da serosa, também uma delgada e atenuada camada de musculatura circular de revestimento.  Clique no link a seguir e você será remetido ao site Gastrointestinal Pathology Index e observará fotomicrografia em pequeno aumento de divertículo cólico. Perceba que suas paredes são compostas basicamente por mucosa e serosa. Para voltar ao texto, apague a janela que se abrir, clicando no botão com um X em seu canto superior direito. link 2

A musculatura cólica do segmento acometido pela doença diverticular está espessada, principalmente e em maior grau quando o segmento afetado é o colo esquerdo. As tênias cólicas estão espessadas e podem assumir um aspecto cartilaginoso. Seu encurtamento e o espessamento da musculatura circular têm sido responsabilizados pelo aspecto em sanfona assumido pelo colo acometido pela afecção, produto da hipersegmentação cólica que se desenvolve. Clique no link a seguir e você será remetido ao site Gastrointestinal Pathology Index e observará segmento cólico abeto acometido por doença diverticular. Perceba, além dos orifícios diverticulares, o espessamento da parede cólica característico da doença. Para voltar ao texto, apague a janela que se abrir, clicando no botão com um X em seu canto superior direito. link 3

Apesar de serem característicos da doença, os divertículos podem não ser visíveis em alguns casos de doença diverticular complicada, sendo o espessamento da musculatura cólica o fator determinante do diagnóstico da afecção. Sendo assim, a anormalidade muscular da parede cólica é o aspecto mais consistente na formulação do diagnóstico da doença diverticular.

Histologicamente observa-se, na doença diverticular, espessamento de ambas as camadas musculares da parede cólica. O espessamento da musculatura longitudinal deve-se ao depósito exagerado de elastina entre suas fibras musculares, fato característico da doença diverticular, pois normalmente a elastina só é observada na musculatura circular. O espessamento desta, por sua vez, deve-se ao seu fracionamento em resposta à hiperatividade muscular própria da doença diverticular, e à infiltração, entre os fascículos musculares fracionados, de tecido conjuntivo fino.

Os divertículos podem ser causa de complicações. Em seu interior comumente penetram fezes, que podem lá permanecer, tornar-se desidratadas, formar fecalitos e causar inflamação por lesão da mucosa diverticular e tecidos circunvizinhos. A inflamação resultante pode acentuar a diminuição da luz cólica e provocar fenômenos obstrutivos. Pode também ser causa de peritonite local, formação de abscesso, se houver perfuração localizada, ou mesmo peritonite generalizada, se houver perfuração para a cavidade livre. É comum os órgãos adjacentes acolarem-se ao sítio de inflamação diverticular na tentativa de bloquear o processo. Sendo assim, não é infreqüente a formação de fístulas entre o colo e tais estruturas. A fístula colovesical é a fístula mais comumente encontrada na doença diverticular. Clique no link a seguir e você será remetido ao site Gastrointestinal Pathology Index e observará um segmento excisado de diverticulite cólica perfurada. A foto foi pouco exposta, mas a faixa central mais escura representa o local da perfuração cólica no sítio de diverticulite. Para voltar ao texto, apague a janela que se abrir, clicando no botão com um X em seu canto superior direito. link 4

A doença diverticular pode ser causa de sangramento intestinal. Em geral, quando ocorre, o sangramento assume as características de hematoquezia (eliminação de fezes formadas com sangue na superfície). O diagnóstico diferencial com neoplasia do colo é mandatório. A propósito, não existe relação alguma provada entre doença diverticular e surgimento de neoplasia cólica. A primeira não predispõe à segunda. No entanto, ambas podem coexistir!

Uma manifestação controversa da doença diverticular é o sangramento digestivo baixo, algumas vezes dramático, que pode causar choque hipovolêmico em minutos. É mais comumente observada em pacientes com doença diverticular difusa do colo e oligossintomáticos ou assintomáticos até então. Normalmente incide em indivíduos mais idosos. Há evidências na literatura de que tal tipo de sangramento que ocorre em pacientes com doença diverticular difusa, na realidade não se origina de divertículos, mas de angiodisplasias cólicas ou de outras lesões intestinais com potencial hemorrágico, tais como úlceras cecais, tumores cólicos e do intestino delgado, malformações arteriovenosas do intestino delgado, etc. Mas, considerando que uma enterorragia pudesse ser causada pela doença diverticular, explica-se seu aparecimento pela formação de úlcera de decúbito no colo diverticular, sobre o local onde transita o vaso cólico que penetra na parede intestinal, ao lado do qual se formou o divertículo. Tal úlcera de decúbito é formada por fecalito aprisionado no interior do divertículo, que se avoluma à proporção que fezes líquidas penetram no interior do divertículo, desidratam-se e somam espessura ao fecalito.

Etiopatogenia

Os divertículos cólicos são estruturas adquiridas, formadas pela pulsão da mucosa através de pontos de fraqueza na parede cólica.  Tais pontos de fraqueza são os orifícios de penetração dos vasos cólicos na parede intestinal, oriundos da artéria marginal, com destino à submucosa. Possuem formato sacular (ou de frasco de Erlenmeyer), como se fossem empurrados com o dedo, da luz cólica, através de sua parede muscular, nos pontos de fraqueza desta, para projetarem-se externamente à parede cólica. Sendo assim, são formados internamente apenas pela mucosa e submucosa cólicas e externamente pela serosa do colo, nos locais em que esta camada recobre o órgão.

Há fortes evidências de que tais divertículos de pulsão são causados pelo hábito ocidental de ingestão de dieta pobre em fibras vegetais, que forma fezes de pequeno volume, provocando a segmentação excessiva do colo, com aumento de sua pressão intraluminar. A hipersegmentação provocada pelo excesso de atividade da musculatura circular do colo leva à formação de câmaras cólicas fechadas, onde ocorre aumento da pressão intraluminar, que empurra a mucosa de encontro à parede muscular. Nos pontos de penetração dos vasos cólicos na parede muscular, pontos de fraqueza parietal cólica, a mucosa que está sendo empurrada de encontro à parede cólica, e que irá formar o divertículo, encontra fácil acesso e é projetada para fora dos limites parietais do colo, sendo só recoberta pelas lâminas teciduais que envolvem o colo, normalmente só serosa, nas faces peritoneais do colo, e tecido areolar frouxo, nas faces retroperitoneais (Figura 3).

Os divertículos cólicos formam-se mais freqüentemente entre as tênias antimesentéricas  e a mesentérica, em ambos os lados da superfície do colo. Menos comumente, formam-se também entre as tênias antimesentéricas. Tais locais de formação diverticular são os locais de penetração na parede muscular do colo dos vasos cólicos terminais curtos (entre tênias antimesentéricas e mesentérica) e  longos (área antimesentérica intertenial).

A camada muscular longitudinal do colo representada pelas robustas tênias, forma uma barreira local contra o aparecimento de divertículos. Estes surgem através da musculatura circular, mais fina. Ambas as camadas musculares, no entanto, estão espessadas na doença diverticular, por diferentes razões. As tênias, caracteristicamente na doença diverticular, estão infiltradas por quantidades excessivas de elastina (normalmente tal proteína só é encontrada na camada muscular circular). A musculatura circular da parede cólica encontra-se espessada por partir-se em fascículos separados por tecido conjuntivo fino, provavelmente devido à hiperatividade muscular existente na doença diverticular. O espessamento de ambas as camadas musculares do colo leva à diminuição da luz intestinal, que acaba por redundar em alguns dos sintomas e complicações da doença. Há fortes evidências a sugerir que o fator predisponente da doença diverticular é, na realidade, a existência de uma anormalidade primária da estrutura muscular da parede cólica, que precede o aparecimento dos divertículos.

Classificação

Atualmente classifica-se a doença diverticular em complicada e não complicada.

A doença diverticular complicada em geral cursa com diverticulite e suas complicações: obstrução, perfuração livre ou bloqueada, abscessos pericólicos, formação de fístulas e sangramento digestivo baixo.

A doença diverticular não complicada pode ser sintomática ou não (Vide Quadro Clínico).

Antigamente a doença causada por divertículos no colo recebia uma de duas denominações: diverticulose ou diverticulite. Casos com diverticulose eram aqueles em que os divertículos não estavam inflamados. Tinha-se também como conceito que os portadores de diverticulose eram geralmente assintomáticos e que, quando apresentavam sintomas, estes dever-se-iam a inflamação diverticular e suas complicações. Entretanto, não foram raras as vezes em que, mesmo diante da presença de sintomas incapacitantes, o patologista enfrentava dificuldades em reconhecer, em espécimes de colo excisado, qualquer sinal de inflamação. Por esta razão, passou-se a adotar o termo mais abrangente doença diverticular para definir a afecção em qualquer uma de suas formas de apresentação clínica.

Quadro Clínico

A doença diverticular apresenta-se clinicamente sob duas formas principais: não complicada e complicada. A doença diverticular não complicada, por sua vez, pode ser sintomática ou assintomática.

A doença diverticular assintomática em geral é descoberta em investigação clínica para afastar outras afecções.

Pacientes com doença diverticular não complicada sintomática normalmente queixam-se de dor, em geral do tipo cólica, localizada na fossa ilíaca esquerda ou no abdome inferior associada com alteração do hábito intestinal. São indivíduos que eram assintomáticos e passam lentamente a apresentar mudança sintomática do hábito intestinal. Se tinham um funcionamento intestinal regular, passam a eliminar alternadamente ora fezes normais, ora endurecidas, ora diarréicas. Quando eliminam fezes endurecidas, o fazem com dificuldade e geralmente expelem cíbalos (coprólitos, fezes que se assemelham às de cabrito). Distensão abdominal, dor na fossa ilíaca direita, evacuações de muco e urgência para defecar, em casos de diarréia também são sintomas observados.

Tais sintomas não são específicos de doença diverticular, podendo ser encontrados em casos de síndrome do intestino irritável. Da mesma forma, se a eles somarmos eliminação de sangue nas fezes, anemia e perda de peso, poderemos estar diante de um caso de câncer do intestino grosso. A diferenciação só poderá ser possível com a endoscopia digestiva baixa ou com o estudo radiológico contrastado do intestino grosso.

Diagnóstico

Diante de um paciente com suspeita clínica de doença diverticular impõe-se a realização de uma investigação complementar que variará em complexidade de acordo com a forma de manifestação da moléstia, não só para defini-la, mas, também e principalmente, para afastar a presença de outras afecções com maior poder mórbido e letal.

Hematologia

Sinais de anemia no hemograma podem ser devidos a perda sangüínea em pacientes com doença diverticular, mas, mais comumente, sinaliza para a presença de outras lesões, que deverão merecer investigação mais acurada. Pacientes com diverticulite e suas complicações costumam apresentar leucocitose de intensidade variável, de acordo com a complicação, com desvio à esquerda.

Urinálise

Pacientes com fístula colovesical apresentam hematúria, leucocitúria, piúria, cilindrúria intensas e fecalúria. A urocultura com contagem de colônias definirá infecção urinária causada por germes gram negativos. Pacientes com diverticulite sem abscesso podem apresentar hematúria ao exame parcial de urina pela simples contigüidade do processo inflamatório com o ureter ou a bexiga urinária.

Retossigmoidoscopia Rígida

Exame simples e de fácil realização em qualquer hospital geral ou consultório coloproctológico, que define rapidamente a origem de sangramentos digestivos baixos de moderada intensidade. Caso a origem do sangramento esteja ao alcance do aparelho (25 a 30 cm dependendo do modelo) pode-se realizar biópsias por meio da luz do aparelho com o uso de pinças apropriadas. Quando o sangramento digestivo baixo é intenso, porém, normalmente o exame torna-se impraticável. No diagnóstico da dor abdominal baixa também pode ser útil ao revelar diminuição da luz intestinal na altura da junção retossigmóidea ou acima dela, com edema mucoso e sinais inflamatórios locais, o que levantará a suspeita de doença diverticular e apontará para a necessidade de realização de outros exames para definir o diagnórtico.

Colonoscopia

Exame de escolha para o diagnóstico definitivo da maioria dos casos de doença diverticular. Na maioria dos casos, define a afecção e faz o diagnóstico diferencial com outras lesões, possibilitando que biópsias ou até a excisão de lesões não diverticulares sejam feitas. Possui emprego limitado, no entanto, na vigência de sangramento intestinal maciço, por dificuldades de visibilização. Em casos de sangramento intestinal crônico, por outro lado, é de extrema valia, pois define objetivamente a lesão e permite, em grande parte dos casos seu tratamento. De realização limitada até há alguns anos devido à infraestrutura necessária para seu emprego, difundiu-se rapidamente e vem sendo empregada com maior freqüência na maioria dos grandes centros. Ultimamente vem sendo empregada em lugar da arteriografia seletiva para o diagnóstico de lesões hemorrágicas do intestino, uma vez que estas normalmente não sangram continuamente e, com preparo adequado do intestino, podem ser mais completamente abordadas com o colonoscópio. Seguem abaixo links do site Atlas of Gastrointestinal Endoscopy de diversas fotos endoscópicas de casos de doença diverticular. Os links serão abertos em nova janela que poderá ser apagada, para que se retorne à leitura deste texto, clicando em seu botão superior direito identificado com um X.

Imagens colonoscópicas de divertículos
Imagens colonoscópicas de diverticulite
Imagem colonoscópica de sangramento diverticular -
vaso visível no colo diverticular em caso com história pregressa de sangramento intestinal baixo. No momento do exame, não havia sinais de sangramento.
Imagem colonoscópica de sangramento diverticular
Imagem colonoscópica de divertículo invertido -
sua imagem não deve ser confundida com a de pequenos pólipos, pois uma biópsia local produziria resultados desastrosos.
Imagem colonoscópica de angiodisplasia cólica
Imagem colonoscópica de angiodisplasia cólica com sangramento ativo

Estudo Imagenológico do Abdome

Rx Simples

Radiografias simples do abdome são normalmente realizadas em pacientes com doença diverticular complicada. Podem detectar sinais de íleo paralítico, de massa intraabdominal e de derrame peritoneal (em casos de peritonite purulenta ou fecal).

Enema Opaco

O enema opaco com duplo contraste (bário e ar, segundo a técnica de Welin) é o exame consagrado pelo tempo para o diagnóstico da doença diverticular em todas as suas fases, por ser barato e de realização difundida na maioria dos centros. Ultimamente tem sido substituído pela colonoscopia por ser esta mais precisa na descrição das lesões e por permitir a realização de biópsiasde cólica e da hipersegmentação que leva à formação de divertículos). O enema opaco confere informações a respeito da extensão da doença, da gravidade de eventuais estenoses existentes, da presença de abscessos e fístulas. Muito se discute sobre o momento adequado de realizá-lo em pacientes com quadro clínico de diverticulte, pois há relatos na literatura de peritonites eclodidas pela realização de enemas opacos que desbloquearam perfurações diverticulares até então contidas por bloqueio aderencial de vísceras adjacentes. As peritonites por fezes, pus e bário assim formadas são extremamente letais. Para contornar tal perigo, alguns centros utilizam contraste hidrossolúvel para a realização imediata de enemas contrastados em pacientes com diagnóstico de doença diverticular complicada. O contraste hidrossolúvel, caso ocorra desbloqueio da perfuração diverticular é muito menos pernicioso do que o bário. A presença de estenose da luz cólica em casos de doença diverticular complicada nunca poderá afastar a presença concomitante de uma neoplasia, logo uma investigação endoscópica subseqüente se impõe. Se a estenose for total, é provável que o diagnóstico só seja firmado à laparotomia ou pelo exame histopatológico da peça excisada. O enema opaco também pode ser usado como forma terapêutica para ajudar a sustar hemorragias digestivas baixas maciças. Nestes casos, o exame é feito sem preparo intestinal e não possui finalidades diagnósticas. O bário e o ar injetados sob pressão na luz cólica, são arremessados contra a parede do intestino grosso e exercem compressão local sobre pontos delicados de sangramento (tais como as angiodisplasias) e evocam o despertar da cascata da coagulação. O acompanhamento radiográfico de tal tipo de enema é tão-somente necessário para certificar-se de que o bário atingiu todos os segmentos do intestino grosso, até o ceco.

Cistografia

A cistografia pode ser realizada para o diagnóstico de um caso suspeito de fístula colovesical em que o enema opaco não demonstrou o trajeto fistuloso.

Fistulografia

Exame empregado para a confirmação diagnóstica de fístulas colocutâneas e perianais extraesfinctéricas. É realizada com a injeção de contraste hidrossolúvel no trajeto fistuloso.

Ultra-Sonografia

Ajuda na diferenciação entre uma massa abdominal sólida de uma contendo líquido em seu interior (abscesso), mas seus resultados podem ser obscurecidos pela presença de alças intestinais delgadas dilatadas aderidas à massa inflamatória.

Tomografia Computadorizada

Exame radiológico de escolha no diagnóstico da doença diverticular complicada. É capaz de diagnosticar casos de diverticulite aguda, coleções líquidas extramurais, abscessos pericólicos, fístulas colovesicais e presença de infecção a distância. Sua precisão no diagnóstico de abscessos, tornaram o exame de especial importância na drenagem percutânea pré-operatória de tais lesões.

Arteriografia Mesentérica Superior Seletiva

Exame empregado para o diagnóstico de lesões hemorrágicas do intestino. Permite o diagnóstico do ponto de sangramento e, por vezes, seu tratamento por meio de embolização ou da injeção de substâncias vasopressoras. Detecta sangramentos que ocorrem em velocidades maiores do que 0,2 a 0,5 ml/min, não sendo tão precisa no diagnóstico de lesões sangrantes do intestino quanto a cintilografia com tecnécio. Possui emprego útil na localização do ponto de sangramento por ocasião do tratamento cirúrgico de casos de hemorragia maciça. Nestes casos, o cateter de angiografia é deixado no local após o exame angiográfico ter localizado a região de sangramento. O paciente é levado ao centro cirúrgico e após a mobilização do colo no lado do sangramento detectado pela angiografia, injeta-se azul de metileno no cateter e observa-se com maior precisão o local de sangramento, de forma que uma excisão intestinal mais conservadora possa ser realizada. Infelizmente, na prática, nem sempre se consegue realizar a angiografia seletiva em pacientes com hemorragia digestiva baixa, na vigência do sangramento, o que diminui a utilidade deste método.

Cintilografia

Realizada com tecnécio como marcador de contraste coloidal sulfúrico ou das próprias hemácias do paciente. O material marcado é injetado em veia periférica do paciente e é acompanhado pelo cintilógrafo. Pode detectar sangramentos de pequena intensidade (até 0,05 a 0,10 ml/min). É exame de muita utilidade em centros que possuem a aparelhagem sofisticada necessária para a sua realização.

Tratamento

Doença Diverticular Não Complicada

Tanto a doença assintomática quanto a sintomática deve ser tratada com o aumento do teor de fibras não processadas na dieta numa dose de 24 a 30 g por dia de fibra. O farelo de trigo, por exemplo, apresenta 42,9 g de fibra para cada 100 g de farelo. Sabe-se que as fibras, na dosagem supracitada, normalizam o tempo de trânsito fecal, aumentam o peso e o volume das fezes e reduzem as pressões intracólicas. Em vários estudos, os sintomas de pacientes com doença diverticular não complicada desapareceram, em proporção significante dos casos, após o início do emprego do farelo. Da mesma forma que o farelo, o emprego da semente do psyllium ou da metilcelulose também produz efeitos satisfatórios em pacientes sintomáticos e na prevenção de sintomas, nos assintomáticos. Em geral, duas a três administrações diárias (uma colher, das de sopa, em um copo, dos de água), após as refeições, são suficientes. 

Os pacientes sintomáticos que mantêm sintomas apesar do aumento adequado do teor de fibras na dieta, podem-se beneficiar do emprego de antiespasmódicos (em casos de cólicas), como o brometo de pinavério (que alegadamente não produz efeitos anticolinérgicos colaterais em outros órgãos como o olho, bexiga urinária e coração) ou o brometo de N-butilescopolamina  e de antidiarréicos (tal como a loperamida).

Doença Diverticular Complicada

Complicações Infecciosas

Os pacientes com diverticulite aguda, abscessos abdominais e pélvicos, peritonite purulenta e fecal e fístulas com comprometimento do estado geral devem ser estabilizados em ambiente hospitalar antes que o tratamento definitivo seja instituído.

O paciente deve ser colocado em jejum alimentar e, se houver sinais de íleo adinâmico, uma sonda nasogástrica deve ser passada e sua drenagem deve ser continuamente monitorada.

A desidratação e o choque hipovolêmico, se existirem, devem ser agressivamente compensados com soluções cristalóides administradas por meio de um cateter de grosso calibre em veia periférica. Uma veia central deve ser cateterizada para a mensuração da pressão venosa central (PVC) e seu monitoramento contínuo. Uma sonda vesical deve ser passada e mantida ligada a sistema coletor estéril fechado para monitoramento contínuo do débito urinário.

A infecção, geralmente causada por flora intestinal mista (aeróbica gram negativa e anaeróbica), deve ser debelada com antibióticos ou associação antibiótica bactericida de amplo espectro (uma excelente associação é uma cefalosporina de 1ª geração + aminoglicosídeo + metronidazol).

A dor pode ser combatida com a administração de inibidores da biossíntese de prostaglandinas (um agente que promove bons resultados é o tenoxican) ou com dipirona (benéfica por possuir efeito antitérmico associado). Deve-se evitar o emprego da morfina, pois apesar de ser um analgésico potente, costuma elevar a pressão intracólica, efeito indesejável em pacientes com doença diverticular.

Pacientes com diverticulite aguda não avançada podem, apenas com o regime acima, evoluir para a regressão dos fenômenos inflamatórios responsáveis pelos sintomas da doença e recuperar o estado geral e o trânsito cólico, podendo então seu manejo ser puramente clínico. Recuperando-se da fase inflamatória aguda, tais pacientes devem ser colocados sob um regime dietético de alto teor de fibras, para evitar a recidiva da complicação diverticular. Pacientes com diverticulite aguda recidivada serão melhor tratados cirurgicamente, de preferência após promover-se a regressão dos fenômenos inflamatórios, com as medidas acima descritas. Sendo isto possível, o colo é adequadamente preparado e o paciente é submetido a uma excisão do segmento intestinal acometido pela diverticulite com reconstrução primária do trânsito intestinal por meio de anastomose colorretal término -terminal em plano único de pontos separados totais extramucosos com fio absorvível sintético pouco reacional (ácido poliglicólico, por exemplo) nº 4-0. A anastomose pode também ser feita por grampeamento automático com grampos de titânio. Nos casos em que o colo não consegue ser adequadamente preparado, optamos pela operação de Hartmann (colostomia terminal do coto cólico proximal em fossa ilíaca esquerda e fechamento do coto retal após a excisão do segmento afetado pela diverticulite) (Figura 4). Num segundo tempo, 6 a 8 semanas mais tarde, o trânsito intestinal é recomposto da forma acima citada.

Pacientes com abscesso abdominal ou pélvico, após as medidas de recomposição do estado geral acima descritas deverão ser encaminhados para a tentativa de drenagem percutânea das lesões sob controle tomográfico. Conseguindo-se estabelecer a drenagem eficaz e o controle da infecção, o paciente é estabilizado sem pressa e tenta-se operá-lo com preparo de colo adequado. Se isto for possível, uma ressecção intestinal com reconstituição primária do trânsito colorretal poderá ser realizada. Se o paciente for operado na vigência de secreção purulenta grosseira na cavidade, será mais seguro proceder à operação de Hartmann, como descrita acima.

Pacientes tratados cirurgicamente de doença diverticular com fístula poderão sofrer excisão do segmento intestinal doente e da fístula e reconstrução imediata do trânsito colorretal como descrito acima, caso seu intestino tenha sido adequadamente preparado. Caso contrário, a operação de Hartmann será o procedimento mais seguro a ser adotado.

Pacientes operados na vigência de peritonite purulenta ou fecal não devem sofrer anastomose alguma no interior da cavidade. O melhor procedimento a ser adotado é a operação de Hartmann associada à irrigação copiosa da cavidade abdominal com solução salina isotônica morna e o fechamento da cavidade por meio de uma peritoniostomia com tela de Marlex. Tais pacientes são reoperados a cada 2 dias para revisão e nova lavagem da cavidade peritoneal até ter-se certeza de que não está mais havendo acúmulo peritoneal de secreção purulenta. Isto constatado, a parede abdominal é fechada com pontos separados subtotais (aponeurótico-peritoneais) de fio inabsorvível inerte (náilon ou prolene) nº 0, sendo a pele e o tecido celular subcutâneo deixados abertos para curativos freqüentes para evitar infecção de ferida operatória. A pele será reaproximada com pontos falsos de fita adesiva hipoalergênica 3 a 5 dias após constatada a ausência continuada de infecção local.

Complicações Obstrutivas

Na vigência de suboclusão intestinal ou de oclusão intestinal completa, os pacientes também deverão ser tratados em ambiente hospitalar.

Os pacientes deverão ser compensados antes da realização do tratamento definitivo, que será sempre cirúrgico. Deverão ser colocados em repouso intestinal, com jejum absoluto e passagem de sonda nasogástrica e aspiração contínua das secreções gástricas, cujo volume drenado será criteriosamente monitorado. A depleção de espaço extracelular será compensada com a administração de cristalóides por meio de cateter de grosso calibre inserido em veia periférica. A PVC será monitorada por meio de cateter venoso central, e sua medida norteará a reposição de líquidos e eletrólitos. Uma sonda vesical de demora será passada e ligada a sistema estéril fechado de drenagem para monitoramento da diurese. Estabilizado o paciente, terá condições de ser tratado cirurgicamente.

Se o paciente na realidade apresentar episódios de suboclusão intestinal e seu colo puder ser adequadamente preparado no pré-operatório, poderá ser possível realizar a ressecção do segmento intestinal acometido pela doença e reconstituição primária do trânsito intestinal nos moldes acima descritos para a diverticulite. Caso o intestino não possa ser adequadamente preparado, em pacientes com suboclusão, ou nos casos de oclusão completa, o procedimento mais seguro a ser empregado, novamente, é a operação de Hartmann. Não se deve esquecer de tratar cirurgicamente tais lesões obstrutivas segundo princípios oncológicos, uma vez que nunca se sabe se a causa da oclusão é ou não uma neoplasia.

Complicações Hemorrágicas

Caso seja necessário operar um paciente para debelar uma hemorragia digestiva baixa maciça é melhor que se proceda a intervenção sabendo que segmento intestinal abordar, segundo os achados colonoscópicos, ou arteriográficos ou cintilográficos pré-operatórios. Mesmo com estes recursos diagnósticos, nem sempre se consegue localizar o sítio de sangramento. Não dispondo de tais recursos, a decisão acaba tendo que ser tomada na mesa cirúrgica, de forma heróica. Um fator complicador é que, quando o sangramento é maciço, mesmo originado de uma lesão cólica distal, em geral o sangue reflui para os segmentos cólicos proximais, dificultando o julgamento do cirurgião sobre que segmento cólico excisar. Caso não se disponha de meios de realizar uma colonoscopia peroperatória, na tentativa de localizar a lesão, o procedimento mais seguro a ser adotado é a colectomia total com ileorretostomia primária término-terminal em plano único extramucoso de pontos separados totais extramucosos, com fio absorvível sintético pouco reacional (ácido poliglicólico, por exemplo), ou fio inabsorvível inerte (náilon ou prolene) nº 4-0.

Prognóstico

Há relatos consistentes na literatura de que o emprego da fibra não processada (farelo de trigo), em doses adequadas (cerca de 30 g/dia), protege pacientes tratados de doença diverticular complicada contra a recidiva da complicação. Há relatos semelhantes de que o farelo diminui significantemente os sintomas de pacientes com doença diverticular não complicada. Sendo assim, atualmente indica-se a ingestão de 30 g de fibras não processadas por dia para qualquer paciente portador de doença diverticular não complicada com o intuito de evitar que estes evoluam para uma das incapacitantes complicações da doença. Tal prática constitui-se em medida simples e barata a ser adotada em pacientes normalmente idosos e que cursam com afecções associadas de outros órgãos, possuindo, em geral, um risco cirúrgico elevado.

Uma preocupação do cirurgião que opera um caso de diverticulite aguda num paciente com divertículos distribuídos difusamente no colo é onde proceder a excisão proximal do espécime, pois pode haver receio de, fazendo a reconstituição do trânsito colorretal com um segmento cólico repleto de divertículos, estar-se submetendo o paciente mais tarde ao risco de recidiva da diverticulite, necessitando de outra operação. Tal risco tem variado na literatura entre 2,1 e 3,1 %, logo, inexistindo sinais inflamatórios no intestino escolhido para a reanastomose, este pode ser suturado ao reto, pois a chance de recidiva da diverticulite será mínima. Menor ainda se o paciente passar a adotar uma dieta rica em fibras. 

O prognóstico das operações para o tratamento das complicações da doença diverticular dependerá do estado geral do paciente, da rapidez com que o tratamento adequado seja efetuado e da presença de doenças associadas (diabetes mellitus, doenças cardíacas, câncer, etc.).

Bibliografia

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3. KEIGHLEY, M.R.B. & WILLIAMS, N. S. - Surgery of the Anus, Rectum and Colon, London, W. B. Saunders Co. Ltd., 1993, 2448 p.

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